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CRÉDITO DE PIS/COFINS E EXCLUSÃO DO ICMS NA AQUISIÇÃO: REFLEXÕES PRÁTICAS SOBRE O JULGAMENTO REPETITIVO NO STJ

  • Foto do escritor: Larissa Marcomini
    Larissa Marcomini
  • 2 de jul.
  • 5 min de leitura
STJ julga crédito de PIS/COFINS sobre ICMS na entrada: entenda o Tema 1364

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu relevante passo para a uniformização jurisprudencial ao afetar, sob o rito dos recursos repetitivos, a controvérsia envolvendo o creditamento de PIS e COFINS sobre o valor do ICMS incidente nas aquisições. O julgamento, sob relatoria do Ministro Paulo Sérgio Domingues, tramita como Tema Repetitivo nº 1364, com base nos Recursos Especiais nºs 2.150.097/CE, 2.150.848/RS, 2.151.146/RS e 2.150.894/SC.


O núcleo da discussão reside na alteração promovida pela Lei nº 14.592/2023, que introduziu o inciso III ao §2º do art. 3º das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, vedando expressamente:

“§ 2º Não dará direito a crédito o valor: (...) III – do ICMS que tenha incidido sobre a operação de aquisição.”

Na prática, a nova redação exige que o ICMS destacado na entrada seja excluído da base do crédito de PIS/COFINS, mesmo quando esse valor não é recuperável na esfera estadual, o que compromete a integridade da sistemática não cumulativa.


A Fazenda Nacional sustenta que a vedação apenas reflete o entendimento consagrado pelo STF no Tema 69, de que o ICMS não integra a base de cálculo das contribuições, e, por isso, tampouco poderia compor a base do crédito. Alega que permitir o creditamento sobre valores que não integram a receita bruta geraria benefício indevido.


Por outro lado, os contribuintes defendem que a vedação genérica imposta pela Lei nº 14.592/2023 ignora que, em muitos casos, o ICMS constitui custo real da operação, e portanto, despesa legítima a ser considerada no cálculo dos créditos federais — conforme a lógica constitucional da não cumulatividade (art. 195, §12, CF/88) e da jurisprudência do STJ no REsp 1.221.170/PR (tema dos insumos).


DA NÃO CUMULATIVIDADE DO PIS E DA COFINS


A não cumulatividade das contribuições sociais, ao contrário da sistemática típica do ICMS ou do IPI, não opera pela lógica do imposto sobre imposto, mas sim pela dedução proporcional dos valores essenciais à geração da receita tributável. Trata-se, portanto, de um sistema de crédito baseado em custos e despesas efetivamente incorridos, desde que relacionados à atividade-fim da pessoa jurídica, nos moldes do que estabelecem o caput e o §1º do art. 3º das Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003 e o tema 779/STJ


Nesse contexto, é fundamental compreender que não é qualquer valor de ICMS que constitui, por si só, um “custo” relevante à apuração do crédito de PIS/COFINS. Quando o ICMS é destacado na nota fiscal e efetivamente aproveitado como crédito no regime estadual, ele não permanece como encargo financeiro para a empresa. Em termos contábeis, ele é registrado como ativo recuperável e, por conseguinte, não representa custo do produto ou serviço adquirido.


Por outro lado, quando o contribuinte não pode ou não utiliza o crédito de ICMS, esse valor passa a integrar, de forma inequívoca, o custo de aquisição do bem ou insumo. É esse o caso que merece atenção na discussão ora em julgamento pelo STJ.


O ICMS COMO CUSTO EFETIVO: CRÉDITO PRESUMIDO


A título ilustrativo, destaca-se o regime especial de crédito presumido de ICMS concedido a bares e restaurantes em Santa Catarina. Nos termos do art. 21, IV, do Anexo 2 do RICMS/SC, contribuintes enquadrados no TTD 1076 substituem os créditos efetivos do imposto estadual por uma carga tributária reduzida, devendo, em contrapartida, estornar integralmente os créditos de ICMS das aquisições, ainda que regularmente destacados nas notas fiscais.


Nessa hipótese, o valor total da nota de entrada, inclusive o ICMS, é contabilizado como custo irreversível da operação, pois não há recuperação futura por via fiscal. O tributo estadual, assim, perde a natureza de ativo recuperável e converte-se em encargo definitivo.


Exemplo prático – restaurante sob o TTD 1076:


  • Receita bruta com fornecimento de refeições: R$ 500.000

  • Alíquota nominal de ICMS: 12% (geraria R$ 60.000 de ICMS)

  • Regime com crédito presumido: carga efetiva reduzida a 7%, resultando em R$ 35.000 de ICMS devido

  • Créditos das aquisições: obrigatoriamente estornados, conforme exigência normativa

  • Compras de insumos (alimentos, embalagens, etc.): R$ 150.000, com ICMS destacado de R$ 18.000 (12%)


Como os créditos são estornados, os R$ 150.000 devem ser reconhecidos integralmente como custo da operação. Assim, excluir os R$ 18.000 de ICMS da base de cálculo dos créditos de PIS/COFINS, como prevê genericamente o inciso III do §2º do art. 3º das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, não encontra respaldo econômico, contábil ou jurídico.


Afinal, o imposto estadual não representa vantagem fiscal, mas sim despesa efetiva, e a negativa de seu aproveitamento fere a lógica da não cumulatividade consagrada no art. 195, §12, da Constituição Federal. Nessas circunstâncias, a base de cálculo correta para o crédito das contribuições seria o valor integral da aquisição (R$ 150.000), e não o valor líquido do ICMS (R$ 132.000).


UMA DISTORÇÃO QUE O STJ DEVE CORRIGIR


Importa frisar que essa discussão não se limita ao exemplo acima. Existem múltiplas hipóteses em que o contribuinte não pode se creditar do ICMS (seja por opção por regime simplificado, vedação expressa ou inaplicabilidade técnica), mas ainda assim tem direito ao crédito de PIS/COFINS pela essencialidade do insumo, conforme entendimento consolidado no REsp 1.221.170/PR (Tema 779/STJ).


Portanto, sob a ótica da contabilidade de custos e da mecânica de apuração do ICMS em confronto com as contribuições ao PIS e à COFINS, é incorreto afirmar que todo ICMS é custo — mas é igualmente equivocada a ideia de que o ICMS jamais possa ser custo. O ICMS será custo quando não se transforma em ativo recuperável ou quando, por imposição legal, é estornado, absorvido ou irrecuperável, configurando-se, assim, como despesa necessária à formação da receita bruta.


Essa lógica é compatível com os precedentes firmados pelo Superior Tribunal de Justiça, em especial no julgamento do Tema 779/STJ, e com os postulados constitucionais da não cumulatividade, da isonomia e da capacidade contributiva.


Paradoxalmente, a própria Fazenda Nacional, no julgamento do Tema 69 do STF (RE 574.706), sustentou que o ICMS a ser excluído da base de cálculo do PIS e da COFINS deveria ser o “efetivamente recolhido”, e não o destacado na nota fiscal. Embora esse entendimento tenha sido rejeitado pelo Supremo, a União logrou êxito ao inverter essa lógica por via legislativa, ao vedar o aproveitamento do ICMS da entrada como base de crédito — o que, na prática, restaura a mesma assimetria antes censurada pelo STF.


Para ilustrar essa incongruência, considere-se a seguinte situação:


·         Receita de vendas: R$ 500.000, com ICMS destacado: R$ 60.000

·         Aquisições no mesmo período: R$ 150.000, com ICMS destacado: R$ 18.000


Se, por força da nova legislação, o ICMS não pode ser considerado na base de cálculo dos créditos de PIS/COFINS, mas permanece excluído da base dos débitos, haverá um descompasso:


·         Débito de PIS/COFINS: calculado sobre R$ 440.000 (receita líquida de ICMS)

·         Crédito de PIS/COFINS: calculado sobre R$ 132.000 (compra líquida de ICMS)


Nesse caso, o contribuinte suporta o impacto econômico do ICMS na aquisição, sem que ele componha a base de cálculo do crédito — e simultaneamente, deixa de considerar o ICMS da receita, por decisão do STF. O resultado final é um incremento artificial da carga tributária federal, em violação ao regime de neutralidade econômica.


É precisamente essa a distorção que o STJ terá oportunidade de corrigir no julgamento do Tema Repetitivo nº 1364, harmonizando a interpretação do inciso III do §2º do art. 3º das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 à realidade econômico-contábil do ICMS como custo, e à coerência sistêmica da não cumulatividade federal.

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